I Congresso Nacional de Segurança e Defesa

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Seminário «Para uma Estratégia de Segurança Nacional»

No dia 28 de Abril de 2010 teve lugar no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), mais seminário de promoção do I Congresso Nacional de Segurança e Defesa.

O seminário teve como tema «Para uma Estratégia de Segurança Nacional» e foi organizado em duas partes. Na primeira parte o Prof. Doutor Adriano Moreira, Prof. Emérito do ISCSP-UTL, desenvolveu o tema «Conceito Estratégico de Segurança Nacional». Após o intervalo coube ao Embaixador Alexander Ellis, Embaixador Reino Unido (RU) em Portugal, apresentar «As grandes linhas da Estratégia de Segurança Nacional do Reino Unido». Foram comentadores deste último tema o Contra-almirante António Silva Ribeiro, Subchefe do Estado-Maior da Armada, e o Doutor Bruno Cardoso Reis, do Instituto de Ciências Sociais.

EVENTO

A abertura do seminário coube ao Prof. Doutor João Bilhim, Presidente do ISCSP, que em nome do Prof. Doutor Fernando Ramôa Ribeiro, Reitor da Universidade de Lisboa, deu as boas vindas aos presentes e felicitou os organizadores do I CNSD. Referindo-se ao tema do I CNSD, a Segurança Nacional, o Prof. Doutor Bilhim disse tratar-se de um tema útil e honroso. Explicou que o ISCSP se manifestou disponível, desde cedo, para colaborar nesta iniciativa porque as questões de segurança nacional têm cada vez mais lugar nas universidades, em especial, naquela a que preside, que desde há muito tem um Mestrado em Estratégia.

De seguida, o Dr. Figueiredo Lopes saudou a audiência e agradeceu ao Prof. Doutor Bilhim, pedindo-lhe para transmitir também a mensagem de agradecimento ao Prof. Doutor Fernando Ramôa Ribeiro, pela oportunidade e organização do evento. Dedicou depois uma palavra de enorme gratidão ao Prof. Doutor Adriano Moreira pelo apoio decisivo que tem dado à organização do Congresso e pelo empenho importantíssimo como Presidente da Comissão Científica. Agradeceu também ao Prof. Doutor Luís Fontoura e ao Prof. Pedro Borges Graça a colaboração na realização deste evento. Lembrou de seguida outras iniciativas já realizadas, que têm servido para lançar a ideia de que é preciso colocar as pessoas a pensar sobre os assuntos de Segurança Nacional, salientando o papel que o ISCSP tem tido e deve continuar a ter. O tema constitui a essência das preocupações do mundo moderno desde há duas décadas, em especial depois do 11 de Setembro, do 11 de Março e do ataque ao Metro de Londres. A inquietação em que vivemos requer a maximização de esforços e sinergias nacionais e internacionais, de forma a dar corpo a uma nova visão que permita enfrentar, com pragmatismo, a incerteza do futuro. As dimensões de segurança interna e externa precisam de ser preenchidas com uma nova abordagem que resulte da articulação entre Forças Armadas, Forças e Serviços de Segurança e a Sociedade Civil. O Dr. Figueiredo Lopes referiu de seguida que os decisores políticos têm de sentir e perceber as preocupações de todos os cidadãos e que este é um fórum para isso mesmo. O facto de ter havido mais de uma centena de propostas de comunicações mostra que há pessoas atentas e com contributos nesta matéria.

O CONCEITO ESTRATÉGICO NACIONAL

O Prof. Doutor Adriano Moreira fitou a audiência, de meia centena de pessoas entre professores, investigadores, militares, empresários e alunos, portugueses e estrangeiros, e disse que “a racionalidade do comando requer a ajuda da sociedade civil”, completou depois dizendo que as questões de Segurança Nacional ultrapassam a “arte do general”. Continuou, dizendo que não sabia bem se devia falar de segurança nacional, de segurança europeia ou de segurança ocidental. Na verdade, na sua visão esclarecida, pretendeu apenas alargar o conceito e para tal socorreu-se de um conjunto de questões para a reflexão da audiência. Os eventos do dia, nomeadamente o ataque financeiro de que o país foi alvo, permitiram ao Prof. Adriano Moreira lembrar a anarquia em que vivemos, embora, como explicou, o universo não é anárquico, o que acontece é que a racionalidade é ultrapassada pelos factos. Os europeus passaram vários séculos a moldar o mundo e agora aperceberam-se de que essa capacidade já não está ao seu alcance, acabaram por despertar no meio desta anarquia. Os americanos ainda vivem na ilusão de que podem moldar o mundo, mas serão incapazes de o fazer.

O Prof. Adriano Moreira prosseguiu o seu pensamento recordando que Portugal não tem conceito estratégico nacional desde 1974. Bem sabemos que o país deixou de ter fronteiras cerradas do Minho ao Guadiana, que as fronteiras políticas actuais são bem diferentes e que a nossa segurança passa pelas organizações de que fazemos parte, nomeadamente da NATO e da União Europeia. Portugal retraiu, tal como aconteceu com as “várias Romas”, e voltou-se para a Europa. A Europa de hoje tem muitas características do passado, curiosamente o número 5 trespassa pela história como símbolo da hierarquia das nações, basta lembrar que quando houve o Congresso de Viena estavam presentes 5 países, a Sociedade das Nações, depois da Guerra 14-18, elegeu 5 países para o Conselho permanente, depois as Nações Unidas promoveram 5 países a membros permanentes com direito a veto e agora fala-se de um Directório de países europeus, em número de 5 (Alemanha, Reino Unido, Itália, Espanha e França). Hoje, tal como no passado, os Estados não são todos iguais, há Estados mais auto-suficientes do que outros, embora todos os Estados Europeus ocidentais precisem de importar matérias-primas ou energia. Na continuação do seu raciocínio, o Prof. Doutor Adriano Moreira chamou à atenção para o facto da escassez de recursos se associar a um conjunto de necessidades que inventámos para o Estado. Quando faltam os recursos e as necessidades são muitas, temos os Estados exíguos. Esta situação reforça ainda mais a análise de que os Estados não são todos iguais. Quanto mais exíguo o Estado é, mais decisões difíceis é preciso tomar. Esquecemo-nos de que a “guerra é como um cisne branco e de vez em quando aparece um preto” a desafiar as concepções de segurança militar. Nesta altura, já a audiência percebia o porquê da introdução.

A ideia de Estado é da Europa, é do ocidente, assim, como os Direitos do Homem ou a Guerra Justa. Trata-se de um património imaterial da Europa que defende valores como justiça no lugar de imposição, ou diálogo em vez de guerra. No entanto, estes valores foram passados com a afirmação do poder sobre o mundo, onde a Europa procurou recursos (matérias primas, energias, mercados para produtos acabados). No passado, camuflava-se a necessidade dos recursos com a difusão da fé, hoje com a defesa de valores. A este propósito o Prof. Adriano Moreira recordou Arnold Toynbee, autor de «Um estudo da História», que analisou 26 civilizações para concluir que as mais bem sucedidas foram as que conseguiram responder com mais eficiência aos desafios de diversas naturezas com que se depararam e que a causa do fim de muitas delas não foi externa mas sim interna. As civilizações «morrem de suicídio, não de assassinato».

A sequência do pensamento levou o Prof. Adriano Moreira a considerar que o primeiro passo no pensamento estratégico de um Estado como Portugal é assumir que é um Estado exíguo. Depois, é preciso garantir janelas de liberdade, que, na sua opinião, em Portugal são o mar, a investigação e o ensino e a língua. É esta janela de oportunidade que permite restaurar a confiança essencial para a sobrevivência do Estado.

AS LINHAS MESTRAS DA NOVA ESTRATÉGIA DE SEGURANÇA NACIONAL DO REINO UNIDO

O Dr. Figueiredo Lopes apresentou o ilustre convidado, o Embaixador Alexander Ellis, Embaixador do Reino Unido em Portugal. Para introduzir o tema salientou o facto das preocupações principais dos Estados não estarem ligadas à soberania mas sim à segurança do Estado e dos cidadãos, o que exige uma aproximação compreensiva, que seja reflectida na lei fundamental do Estado.

O Embaixador Alexander Ellis, num português fluente e esclarecido, saudou os presentes e disse que tinha muito gosto em participar nesta iniciativa. A sua primeira questão, que podia servir de título à sua intervenção, foi “where is our front line?”. Em 1974 a sua mulher, nossa compatriota, ainda muito jovem, teve uma resposta simples quando ouviu os estrondos da revolução: “vêm aí outra vez os espanhóis”. Esta abordagem inicial serviu apenas para explicar que o conceito de segurança vem de pequeno, é cultural, é um conceito simples e óbvio. O conceito de “linha da frente” está associado à ameaça e à defesa. Será que hoje somos capazes de reagir com a mesma rapidez com que as ameaças se apresentam? O RU não é invadido desde 1666, o que tem uma influência profunda na mentalidade das pessoas. A ideia de invasão está associada ao medo e à vergonha.

O Reino Unido é um país global: é membro do Conselho de Segurança e do “Directório europeu”; possui armas nucleares; metade das suas relações económicas acontecem com a Europa e a outra metade com o resto do mundo; é o maior investidor no estrangeiro à escala europeia; tem uma diáspora de 12 milhões de pessoas; tem um papel significativo na NATO, UE e ONU; tem capacidade global como demonstra a sua intervenção no Afeganistão, onde tem 10 000 militares.

Depois desta introdução, o Embaixador Alexander Ellis recorreu às Guerras Peninsulares para demonstrar que a ideia da “front line” esteve sempre presente no espírito do Reino Unido, em especial depois de se ter tornado uma nação global no século XVI. Em 2008, sob a governação de Gordon Brown, foi apresentada a nova Estratégia de Segurança do RU. A estratégia tem essencialmente 5 preocupações: terrorismo, nuclear, crime organizado, Estados falhados e catástrofes naturais. Cada um destes itens mereceu uma explicação individual, salientando-se a noção de que no RU há 200 grupos ligados ao terrorismo e cerca de 30 “complôs” por dia. Há 150 pessoas presas por terrorismo. O RU está familiarizado com este fenómeno deste os primeiros ataque do IRA nos anos 70. Por esta razão, o povo do RU aceita a presença na “linha da frente” do Afeganistão, apesar das mais de duas centenas de baixas. A estratégia do RU para esta ameaça sustenta-se nos 5P (Prevent, Protect, Prepare, Planning, Pursuit). Depois de falar da ameaça nuclear e do esforço de redução (reduzir, não desarmar), o Embaixador Ellis lembrou que há uma ligação do terrorismo ao crime organizado, muitas vezes pela via do financiamento. Neste caso “onde está a linha da frente?”. O terrorismo não existe sem meios. Este tipo de ameaças é combatido de uma forma mais eficaz se houver colaboração entre os Estados, disso é um bom exemplo o MAOC, instalado em Lisboa, e que é uma ideia do RU. A seguir o Embaixador Ellis referiu-se aos Estados falhados como incubadoras do crime organizado, do terrorismo, de proliferação de armas, de pirataria, etc. Neste caso temos, por exemplo, uma “front line” na Somália. Os Estados falhados podem não ser apenas os Estados sem ordem interna, há exemplos disso mesmo.

Como “drivers” da estratégia o Embaixador Alexander Ellis mencionou os recursos (a energia, a alimentação, entre outros), as alterações climáticas (Darfur e os conflitos da água), as pressões demográficas (9 mil milhões em 2050) e a pobreza (importante tema no RU, provoca extremismo).

Relativamente às preocupações futuras mencionou o problema dos recursos, do ponto de vista de que não há dinheiro para tudo e é, cada vez mais, necessário tomar decisões, muitas delas com efeitos a médio e longo prazo, como é o caso das armas nucleares. Depois mencionou a questão da rapidez da mudança dando, como exemplo, o terrorismo que tem mudado muito nos últimos anos enquanto, por exemplo, um programa de submarinos leva imenso tempo a concretizar e, quando termina, já os meios estão desactualizados. Outra questão mencionada foi a da ligação entre interesses e valores, precisamos da democracia mas também da hierarquia, precisamos do “hard” e do “soft”. A preocupação que identificou de seguida foi em relação ao impacto das alterações climáticas. Para terminar mencionou a questão da teocracia versus democracia, ou seja o conflito entre o iluminismo e o radicalismo religioso. O tema é controverso e delicado, mas existe e tem de ser discutido.

“Where is our front line?”. O Embaixador Alexander Ellis terminou afirmando que está espalhada pelo mundo fora.

A partir destas notas, o Doutor Bruno Cardoso Reis e o Contra-almirante António Silva Ribeiro teceram considerações adicionais estabelecendo uma ligação à Política Comum de Segurança e Defesa, à História e à Estratégia, bem como às questões que hoje se discutem de Segurança Nacional.

A Comissão Organizadora,
28 de Abril de 2010

Data: 2010-04-28

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